quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Alta Tautologia

Loucura'slow cura.
Low cura is loucura.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Haikai de Pai p'ra Filho

Tudo o que nasce, vive;
tudo o que vive, morre:
Três verso-gerações.

domingo, 29 de agosto de 2010

Como pode?

Como pode tua beleza
Ser assim tão belicosa?
Desperdiçar-me com incerteza,
fosse eu coisa perigosa.
Já não vejo você bela,
Cataratas em meus olhos.
Não tem cores minha tela
Se tua vaga não navego,
Teu litoral é só abrolhos.
Diabos! Sê feia uma vez,
Pelo menos de viés!
Para que guarde, te esqueça.
Seja toda desespero
e não esta rejeição
de quem me espera filho.
Querer de mim mais nada,
coice tal da bala à arma
É muito pouco pelo
Sonho lindo que carregas
Pelo que só é possível
se te canto; enquanto negas
que me espero em ti
o novo amor que vais parir.
Como pode tua frieza
Ser assim tão desastrosa?
Flor narcisa em dor suprema,
Dispensar-me em sobremesa,
fossem doces os venenos.
Sem alegria, o que seremos?

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Morais e Pessoa

Começo outro poema
Ou termino o mesmo,

Morais e Pessoa?
Sou pessoa, ou moral?

Simplesmente escrevo
Dou vazão à tinta
Consumo a ilusão,
Dou razão à mágica
Ciência à comédia,
Prática trágica...

Morais e Pessoa?
Sou pessoa, ou moral.

Me meti no drama certo
E é essa pobre poesia
Que nem mais me entrego
Enquanto estiver perto
Afinal, o que há de belo
Em ser assim humano
singelo tão sem zelo?

Morais e Pessoa?
Sou pessoa e moral.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Soneto Interior

E consertaram-me a ponte
Mas não se vê o outro lado.
Só tem névoas no horizonte
Más águas rolando debaixo.

Vai longe, vai mágoa,
Distante a levar o riacho
Lavar, em pedra, a alma,
A limpar duro o que acho.

Daqui onde sublimo, renasço.
Em anos a fio, vira um laço?
Num berro atravesso o amor.

Fia toda esta água escura,
Pedra fica até que fura.
Teci-me em seixo interior.

Além da vossa fisiologia

Vós ainda não entendestes
Que o homem sou eu
Vós só precisais ser mulher
do jeito que quiseres,
Além da vossa fisiologia.
Se vós sois dura, sejais.
Pois sejais, mulher, se vós sois fria...
e bem sei que não sois assim,
sois só assim frente a mim,
não sois vós a mulher que via.

A mulher que fiz um filho
Despiu-se em alma bela
de duas, três vezes harpia
por quem cerrei os cílios,
de primeira besteira...
saltei seguro de alegria.

Há tanto o que fazer,
e tão pouco de vós.
E eu que vos queria?
Vos tenho carinho
e temo e tremo frente
um possível vosso amor
agora perdi meu ser
além da vossa fisiologia

tanto mais monstro,
menos me vedes,
quanto mais falo,
menos me ouvis
cheguei no meu nada,
emaranhado de redes,
nem desmaiam-me as pálpebras,
nem há mais querer, nem sono,
além da vossa fisiologia.

Pelo jeito vosso show
ainda nem bem começou
Já fatigais a teoria,
Cansastes os sonhos
mas o saber é inesgotável,
mistura matéria com ideia,
a caro preço afetivo
mas molda novos mundos
dentro do possível,
mordomia quase sábia.
só existe perfeição na realidade
o resto é sonho clássico...
amor não mede em taxas
amor não cabe em chart,
além da vossa fisiologia,
amor é além da arte,
amor é além da morte.

sábado, 31 de julho de 2010

Lados

Quais são meus direitos?
O que me dá respeito
vai sugar seus seios
e já não posso dizer
mais nada ou sofrer
por pensar seu ventre
na real, eu que enfrente
o que me tinha por gente
e ouvimos nosso orgulho
morrer-se em um mergulho,
agora engole seco, barulho.

Quais são meus direitos?
Há dois, lado esquerdo,
e maluco meu peito,
ao me ver lhe perder
você vai ser livre
do amor que fizemos
e pesa-lhe o ventre
passarão os anos,
nosso olhar calado,
cúmplice, saturado,
nunca fiz lhe prender.
Eu só queria o seu lado
se estivesse acordado.

À mãe de meu filho

Mãe de meu filho,

Portadora do investimento sagrado tão desnecessário para ti, o que não queres de mim é toda a minha angústia de te ver me sobrando pelo ventre e estás na tua razão fútil e me apequeno inútil. Não sei porque te quero tanto, mas só me fizeste tanto querer mesmo tanto não me querendo. Só o que já havia aí dentro, de um modo que me enganei e nem sei o que quero. Amei, mas não permitiste esquecer do único jeito que eu sabia esquecer as pessoas sagradas. Quanto não pediste, amada minha. Agora Inês é morta, a velocidade do amor não me importa e trocara tempos verbais, fizesse alguma lambança na tua sentença.
Construísse uma amizade sem jeito, tão desnecessário? Isso que chamas de ideário, de romantismo das coisas que li, dos erros que entendi, talvez de tudo que temos de tão diferentes em ti. Deste filho que seremos desafiando meus amores em todos os vetores e como serei quando aceitar que aquilo que só tive tão pouco e que além vive e que tenho algum mérito crescendo-te meu espírito. Tu passas por tudo isso sem querer me explicar como é ter alguém também eu aí dentro de ti; como se não fosse comigo, a querer ser pai de meu filho.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Come as you are

Kurt Cobain, David Grohl, Krist Novoselic

Come as you are, as you were, as I want you to be.
As a friend, as a friend, as an old Enemy.
Take your time, hurry up, choice is yours, don't be late.
Take a rest, as a friend, as an old memory.

Memory ah, Memory ah, Memory ah.

Come doused in Mud, soaked in Bleach, as I want you to be.
As a trend, as a friend, as an old Memory ahhh.

Memory ahh, Memory ahh, Memory ahh.

And I swear that I don't have a gun
No, I don't have a gun
No, I don't have a gun

Memory ahh, Memory ahh, Memory ahh, Memory ahh. (Don't have a Gun.)

And I swear that I don't have a gun
No, I don't have a gun
No, I don't have a gun
No, I don't have a gun
No, I don't have a gun
(Memory ahh, Memory ahh)

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Branco Luto

Foi-se assim o último dos sonhos,
Contar sílabas em outros quartetos
Ao ver que o desejo é mesmo tão bruto
Sem rima e rumo com a realidade.

O amor só é concreto na nossa cabeça...
Ideal naquilo que lhe faz natureza
Fosse bruta uma figura de beleza
Fosse real uma hipérbole, leveza.

Menos metáfora, foi real bruto.
Morreu o sonho e não era pesadelo.
A poesia estranha, em branco luto,
ao cortejo dos sonhos de infância.

Com violência acabou-se o arcabouço
de metáforas, flores e mágicas
De todas aleg(o)rias possíveis
Desistiu-se de esforço no esboço.

Apagou-se tudo em desgosto
Não se levou nem um pesar...
E a vida real em seu rosto,
Esmero métrico puro, duro ofício...

De plantar flores onde não há jardim.
Tal o cristal é flor do sal,
Odeio versos assim por vício,
Também o amor é flor da dor.

A água, sempre incosciente poesia,
Evapora em outra tempestade
Carga negativa, carga positiva,
Raio que parte em metade viva.

Por enquanto vou vivendo...
Desperto por respeito e ética,
Fazendo por obrigação poética
o que extinto sonhou prazer.

Alguém aí vai precisar de mim?
Eu agora não preciso mais...
Então por favor, me deixa,
Esgoto a sonhar amanhã: zarpai.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

O Poeta e a Atriz

Tua beleza não é só minha,
Nem estarias bela sozinha...
Em mim está toda tua poesia,
É meu o teu drama, carma, azia.
Meu é o olhar que te assusta,
Suspende-te bela e desarma...
Minha a tentativa contemplativa
De beleza com tua víscera natureza.

De tecer mulheres que desejo
Minha poesia já era uma coleção.
Era uma porção de fracassos,
De parcos, profundos amassos.
Curia de vincos e vínculos...
E só te amaria em versos,
Numa vã tentativa estética,
Passaria-os leves, sobremersos.

Mas te amo por dentro, pesado,
pelas entranhas, pelo plexo,
Teço-te em um amor complexo
por tua parte minha em anexo,
te amo pelo phalo, pelo sexo.

Aplico uma tal auto-ética
Que teus princípios escassos,
Em meio a tanta poética,
Beleza e amor, não dê em espaços.
Em vazios vagos, em vácuos,
no palco do preço do talco.

À coxia digo-te: merda!
Tua barriga jazz, corrói,
Abraços, timbres de atriz...
Tu és bela que dói...
Tu és minha castração,
Tu és minha cicatriz.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Expedição

Segui em frente com coragem
Sem negar um só instante
Coerente com a bagagem
Que foi rodando na estante.
Desespero ou esperança,
Segurança ou um credo
Durmir tarde é fácil,
difícil é acordar cedo.
Coloco-me no horizonte
Uma viagem, meio selva,
De surpresas na constante
E natureza me desbravo
Em terçãs alucinantes.
Onde cerro era um campo,
A rosa ataca-me, depravo,
Com peçonha de serpente.
Fez-me amor paralisado,
Uma refeição ainda quente,
Se perder morto por medo,
Abandonado após o bote.
Despedaçados a entulho...
Pisos, tetos, de repente,
Bravo feriu, furou de acúleo,
A rosa fugiu a fazer gente.

O quereres

Caetano Veloso

Onde queres revólver, sou coqueiro
E onde queres dinheiro, sou paixão
Onde queres descanso, sou desejo
E onde sou só desejo, queres não
E onde não queres nada, nada falta
E onde voas bem alto, eu sou o chão
E onde pisas o chão, minha alma salta
E ganha liberdade na amplidão

Onde queres família, sou maluco
E onde queres romântico, burguês
Onde queres Leblon, sou Pernambuco
E onde queres eunuco, garanhão
Onde queres o sim e o não, talvez
E onde vês, eu não vislumbro razão
Onde o queres o lobo, eu sou o irmão
E onde queres cowboy, eu sou chinês

Ah! Bruta flor do querer
Ah! Bruta flor, bruta flor

Onde queres o ato, eu sou o espírito
E onde queres ternura, eu sou tesão
Onde queres o livre, decassílabo
E onde buscas o anjo, sou mulher
Onde queres prazer, sou o que dói
E onde queres tortura, mansidão
Onde queres um lar, revolução
E onde queres bandido, sou herói

Eu queria querer-te amar o amor
Construir-nos dulcíssima prisão
Encontrar a mais justa adequação
Tudo métrica e rima e nunca dor
Mas a vida é real e de viés
E vê só que cilada o amor me armou
Eu te quero (e não queres) como sou
Não te quero (e não queres) como és

Ah! Bruta flor do querer
Ah! Bruta flor, bruta flor

Onde queres comício, flipper-vídeo
E onde queres romance, rock’n roll
Onde queres a lua, eu sou o sol
E onde a pura natura, o inseticídio
Onde queres mistério, eu sou a luz
E onde queres um canto, o mundo inteiro
Onde queres quaresma, fevereiro
E onde queres coqueiro, eu sou obus

O quereres e o estares sempre a fim
Do que em mim é de mim tão desigual
Faz-me querer-te bem, querer-te mal
Bem a ti, mal ao quereres assim
Infinitivamente pessoal
E eu querendo querer-te sem ter fim
E, querendo-te, aprender o total
Do querer que há e do que não há em mim

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Cantiga como for

Cantiga de amigo,
Cantiga de amor,
Cantiga de filho,
A tanto tempo derivo,
Confuso escárnio trovador
nem periga o redondilho,
nem maior, nem amador.

O futuro e o passado
Só existem no presente
E já não iludo de utopias
Pois a alma também cansa de sonhar.
Qual era a diferença
naquele nosso caso?

Cantiga de amigo,
Cantiga de escárnio,
Cantiga de pai,
Cantiga de amor,
Cantiga como for.

O mar, a luz cósmica, o ar

Ideal são coisas que têm luz própria, por definição poética,
A lua já deixou de ser luz cósmica, neste sentido, tangível.
Para o inconsciente do homem, embora ainda não para o indivíduo.
Ainda sobram as estrelas agora que o inconsciente
Foi parar no cosmos, desmergulhou do mar.
Só chega em algum lugar
Se num momento virar luz, virar nave,
E nave-luz virar imagem constante e própria.
Assim, só chega em algum lugar com o auxílio de inteligências e memórias humanas.

Mas o ideal são coisas que não se tem alcance,
Ou não se quer tão cedo.
Ou o ideal, por definição, é a morte,
E ter quem lhe guarde a imagem
Em outros fios de proteína
Que não podem ser mais do que realidade
Do que se compreendia ideal
E embora encanto, enquanto vai vaidade.

Quando vir à luz, chegado das estrelas
Realidade crua, nua, viva
Do ideal que se esquiva
Da luz ideal que nos reflete, refrata
Com as distorções mais ingratas do real abissal
E toda a pressão da água evapora sem gravidade
Responsável por tantos calos e estruturas
Que não fazem sentido no espaço
E certamente irão atrofiar, caducar, despencar, esperamos.

À pressão da luz, tão mais leve já sem corpo,
Ideal é só mesmo a sua velocidade...
Vai iluminando nossa carne e neste platonismo,
O amor é sombra e reflexo do outro em mim.

É um querer dessas tais profundidades
Lhe transformar em luz a ser doada
E no fundo do meu mar você brilhava que ceguei
Sem querer mesmo proteger os olhos.
Você parecia a estrela do idealismo,
Mas o ideal são coisas que não se tem alcance,
Moram nas estrelas mortas e vivas lá do espaço
E se já dá trabalho desmergulhar,
Como será para virar luz cósmica lá na então eternidade?

domingo, 13 de junho de 2010

Pós-contemporâneo

É preciso pensar no futuro
pois o presente não adianta.
Baby,
não dá mais tempo.
É melhor pensar para depois
porque agora já não é do jeito que se queria que fosse.

"Agora" ainda traz todos os sonhos
de outras gerações
que ninguém entende direito
como foi que chegaram até aqui
sendo assim só tradições.

Só depois pode ser melhor,
se organizar agora...
Porque se pensar em agora
só vai dar raiva do meu sorriso
bobo e esperançoso
e das coisas lindas que
agora acontecem misturadas
com a coisa mais custosa
de toda a minha humanidade:
aceitar o amor como ele é
e não queria que assim fosse.

Gostaria de só viver depois...
mas é preciso pós-agora já...
tipo uma inflação galopante,
pensar o depois, o avante,
sem desalinhar da velha teoria do amor,
traga qualquer coisa à alma,
já tão vazia de certezas.

É uma função toda torta,
daquelas que só se faz sozinho,
com muita matemática
de números irracionais,
derivadas e integrais,
conjuntos surreais...

Mas lá vai:
se o meu amor
está fora de mim (em você)
uma hora este amor
que você clama em si,
também estará fora de você...

E será nosso amor,
exteriorizado, pós-contemporâneo
em nossa revolução de outubro.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

La belle dame sans mercy

Je vous salue, Monique. Qui êtes-vous? Explique
São só dúvidas. Qu'est-ce que c'est l'amour, madame?
Haja fascínio e crueldade em tua liberdade, querida.
Como pode acontecer ter tais sentimentos teu rosto?
As boas respostas não bastam para a vida
e o tempo não passa, só pássaros que marcham às armas.
O teu único problema é não gostar de mim, revolucionariamente.
Já é tão difícil te amar que nem sei mais o que é o amor,
pois te amo enquanto símbolo análogo do que destróis em mim...
Pois tenho a maior prova de que o amor está ali, em ti?
Je vous salue, Monique. Qui êtes-vous? Explique
Ma belle dame sans mercy. Explique; apaguei, esqueci...
Qual o significado disso tudo, chérie?
Caminhar sobre estrangeiros empunhando estandartes bizarros
de braços abertos, seios descobertos, a exigir sacrifícios
Lá vem os franceses e vossos processos civilizatórios...
Eu tenho impressionantes poderes observatórios sem ter onde ir
E é assim que eu sei, feliz por ao menos saber
que o dia da Glória est arrivé, vou voar em tua direção
Serei também o meu herói, serei Eros e Pteros
Pois também sei que só se é livre por inteiro
se radicalmente comprometido com a própria paixão.

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Hahaha!

Se as cartas de amor já eram
Ridículas
em seu tempo.
Os e-mails de amor que preferiríamos
Patéticos
No fundo são mais
Ridículos

Ridículo
pela imaterialidade,
por não ser compensado nem pelo valor do peso do papel.
Ridículo
pela ansiedade,
de não ter ritual, de não se rasgar, de não se queimar...
pela falta do testemunho de recibo do carteiro...
Ridículo
Simplesmente por desaparecer sem qualquer traço
de que um dia esteve ali para declarar o seu amor
resumido a diminutos  bits na lixeira de spams,
estes talvez até com mais espaço.

Pois a tecnologia,
e o futuro que vivemos agora,
e os poemas já escritos
Deveriam ter ensinado ao homem que esse comportamento é sobretudo
Ridículo

Mas no fundo o homem bem sabe,
Ridículo
é ficar se repetindo aos outros,
palavras, atos, tentativas,
erros reconhecidos por semelhança,
encher caixas, quiçá de entrada,
de sentimentos gratuitos,
enviar o que se sente, sempre será
Ridículo.

Ser honesto e coerente com as próprias emoções é
Ridículo
E esperar que agora,
só porque é agora, seja
Patético,
só faz isso ainda mais
Ridículo
Pois esperar co-paixão, por qualquer texto de amor,
é o que é,
Ridículo.

domingo, 23 de maio de 2010

Estou cansado

Álvaro de Campos

Estou cansado, é claro,
Porque, a certa altura, a gente tem que estar cansado.
De que estou cansado, não sei:
De nada me serviria sabê-lo,
Pois o cansaço fica na mesma.
A ferida dói como dói
E não em função da causa que a produziu.
Sim, estou cansado,
E um pouco sorridente
De o cansaço ser só isto —
Uma vontade de sono no corpo,
Um desejo de não pensar na alma,
E por cima de tudo uma transparência lúcida
Do entendimento retrospectivo...
E a luxúria única de não ter já esperanças?
Sou inteligente; eis tudo.
Tenho visto muito e entendido muito o que tenho visto,
E há um certo prazer até no cansaço que isto nos dá,
Que afinal a cabeça sempre serve para qualquer coisa.

sábado, 22 de maio de 2010

Movimento dos boêmios

Compreender tua escolha
é compreender minha falta
e aí vem o medo de não
lutar nada objetivo na vida,
além de mais subsistência
no movimento dos boêmios
pois para estas energias
tão novas temo já não ter ralo
até o fim do teu inverno seco.

Como encontrar esta resposta
aqui dentro? Agora só,
se vê uma cicatriz exposta
que a poeira no pé com a enxada,
de vermelha encardiu
e ferida, coagulou calóide
anestesiada pelo álcool.

E o meu amor então?...
Te digo que tens todo o direito
de não aceitar, incredular...
Mas não sei como deixar de te oferecer,
pois será para sempre o meu melhor.

Pois boêmio não é rico, é fértil.
Fosse rico saberia a hora de plantar,
precisaria a hora de colher o seu amor com lucro,
em qualquer terra que escolhesse investir.

Boêmio embasbacado se espalha ao vento,
e imagina com um porre que a terra descuidada não tem dono...
depois, enterrado, brota-se de uma boa tempestade,
cresce caprichoso, em terra devo-luta e nutritiva
para ser frondoso e fazer sombra de majestade viva.

Queria ficar vendo a vida por dias...
só a crescer o fruto que te instalei
ao me aspergir uti possidetis
nesta luta do movimento dos boêmios solitários.

Afinal, o teu corpo rocei latifúndio
inteiramente feliz à luz venusiana.

Mas foste logo construindo uma muralha
e proibiu a entrada de ideia,
me vi só, um lavrador bem e mal-aventurado...
e foste logo jogando café fervente
no meu exército quixotesco que apareceu
a todo custo bradando: - Dulcineia!
Quero ver crescer o amor que te plantei!!!

Do jeito que consegues,
mas tu concebes minha semente.

Nossa espécie exótica aquiescente,
em ti arma um castelo resistente.
Arma-se até as pontas dos dentes.
Assim nosso tesouro selvagem,
já se gera em teu cativeiro.
Cresce fruto de um desejo mais secreto
que se realiza consequente
e logo mais não caberá em teu domínio.

Não mais estiva a ironia biológica...
No fundo mais quero, e aguardo, e confio
em teus neurônios e hormônios,
professo fé num amor pós-contemporâneo
com a paciência de quem agora espera
pois só assim temos a ganhar
e adubado com cerveja
um futuro dia também gérmen
em outra terra tão boa
quanto a tua, formosa, desbunda.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Esquecer o inesquecível
Esquecer o inesquecível
Esquecer o inesquecível
quanto do amor é obsessão?
afinal de contas
querer que o outro me queira
depois que já tem tudo o que
possa querer
é desejar o alcançado

O velho amor

O velho amor civilizado
foi sujeito ao desejo alquebrado
patetice do amor apaixonado
velho amor que se entende sepultado
com esse vazamento
que transborda
especializado em relacionamentos
cômicos que careciam seriedade
e agora não tem a experiência
de se comprometer.

É preciso repensar o amor,
estruturar o desejo,
dar volume à escolha,
o velho amor já não dá conta
de explicar a verdade da vida.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Don’t [let] me be misunderstood.

Leandro id Lascado

[…]

Viver de dedução, é assim que eu vivo [não é, menina?), à espreita dos fatos, à beira dos atos, como se tudo estivesse suspenso só pra assistir à dança fora de moda que eu te propus, um segundo em que tudo parasse de rodar pra acompanhar o movimento mínimo da vontade, uma pausa para o encanto que não coube na tua agenda.

E eu, presa dos meus vícios, vítima do discurso, me embrulhando num papel todo novo pra te dar, eu te vi ter pressa, essa pressa sem direção que chamamos de curiosidade, essa necessidade infantil e tão natural de saber o que o mundo tem a oferecer. Eu vi o teu futuro na minha frente e vi meus braços serem pouca rédea pros teus músculos sadios e sem questão.

Eu vi como há muito tempo não via a poesia sorrir pra mim. Sorri de volta, corri com meu cavalinho pra chuva e achei que assumir o risco era menos ridículo do que de fato é. Eu vi métrica no teu texto, vi semiótica nos teus códigos, vi um encontro onde você viu exercício de estilo.

É de perder em ilusões que se vive, menina, de olhar para as evidências sem entrelinhas, nem óculos escuros. Eu vou aprendendo com o tempo tudo o que você já sabe de cor.

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Olhos azuis

A gente só pensa,
só processa linguagem
e cultura à retina
pois tem alguém além.
Por efeito do outro
tem causa cretina
a inversão da imagem
de sujeito pra objeto

Tem uma dimensão de ser
gente que não se acessa,
não dá p'ra controlar.
'Tá do lado de dentro
do humor do outro.
Só lá se é vítreo,
Só lá se 'tá vivo,
só lá se 'tá morto.

Lá onde me gelo concreto
procurando outra instância
tem tanta falta de afeto
que até blefo ignorância.
Tão pouco é onde piso
que me sustento pelo teto
rarefeito e impreciso,
tal estrábico indiscreto.

Entre o cristalino e o nervo
tem um mistério sagrado,
tem sangue que ferve, verve.

Nas tuas pupilas dilatadas,
espelha-me teu nada mais escuro
no vazio completo dos teus olhos
tua íris moldura um blues
e eu sou a tua mácula míope
em nossos novos olhos azuis

terça-feira, 13 de abril de 2010

quarta-feira, 7 de abril de 2010

Miss X

Jorge Ben Jor

Se ela faz beicinho
Faz charme querendo carinho
Mas na hora H
Ela não quer te dar bola
É sinal que as coisas
Ainda não estão no lugar
Dá um tempo fique frio
E comece a planejar
Se ela não quer se ela não quer
Não desista
Se ela não quer se ela não quer
Insista
Se ela não quer se ela não quer
Não desista. Até ela pegar no seu pé

Você tem que insitir tem tem tem
Você tem que conversar tem tem tem
Você tem que resistir tem tem tem
Você tem que conquistar tem tem tem
Se ela não quer se ela não quer não desista
Se ela não quer se ela não quer insista
Se ela não quer se ela não quer não desista
Até ela pegar no seu pé
Miss X Miss X Miss X Miss X Miss X

domingo, 4 de abril de 2010

A insustentável leveza

"If we have only one life to live, we might as well not have lived at all" (Milan Kundera)

A dualidade maniqueísta entre leve e pesado só parece um grande dilema para a classificação das tradicionais associações ocidentais (positivo/ bom e negativo/ ruim) porque a relatividade da física não costuma ser fácil para a ordem e boa análise aristotélica, ainda que incorporados pela ciência em alguns aspectos. Assim, podemos aceitar intelectualmente - nesta relação entre muitos ou poucos Newtons atraindo nossa existência para o centro gravitacional da terra - que se trata de fato de uma dualidade sensível aos seres dotados de massa.

Porém, dizer em absoluto que determinado objeto ou subjetividade é pesada ou leve determina um ponto de referência que relativizará todo o raciocínio necessariamente: denotativo ou conotativo?  Leve bom, ou leve ruim? Pesado bom, ou pesado ruim? Pesado para quem tem mais força, leve pra quem é mais fraco? Os dois. Uma metáfora só é boa quando é concreta: qualquer nomeação, tipificação e/ou organização não passa de moral, um juízo de valor e/ou necessidade de economia lingüística. Metáfora da metáfora é meta-metáfora e isso não interessa a ninguém (só ao artista censurado, o que não é o caso).

Uma criança, desde o momento em que é fecundada, começa a ganhar peso. Deixa de ser leve e passa a existir com o peso do gozo que é guardado pelo corpo, que o nutre até o momento em que é pesado demais para ser uma pessoa só, nasce.

O peso não pára de crescer. Peso é energia potencial. Peso é corpo. No corpo é onde se sente, é o meio da vida. Cada mililitro de sangue, leite, proteína e água sorvido por um bebê trata-se de energia humana em última instância. Este é um comprometimento do qual não se tem volta, é uma promissória assinada com a linguagem que se ganha a nova cada cognição.

Chega (ou não, para alguns) o momento da vida que somos suficientemente pesados e temos carne, ossos, músculos, nervos, olhos e paladares que são excelentes para nossa independência vital. Suficientes para um ego no limite social de sua liberdade, felicidade, saúde, bem-estar, hormônios estabilizados e em harmonia com os pensamentos.

Esta carne madura começa a murchar logo após seu clímax. Começa a pagar a conta de tanto investimento. A sociedade cobra cada caloria de volta e o peso da cobrança tem o fiel da balança na consciência particular e cada particular ruga no rosto e cicatriz. Muitas vezes dá origem a outra carne da qual se responsabilizará de fornecer energia, voz e peso. "Uma única metáfora pode dar a luz ao amor".

Isso acontecerá enquanto a carne definha e fica insustentavelmente leve (alguns chegam a perder o cálcio dos ossos, quebram). Até o momento em que não há mais nada armazenado naquele corpo para ser entregue de volta ao conjunto da energia humana.

O corpo, a ausência, inúteis, são gentilmente devolvidas à terra, à água, ao fogo, ao ar. A memória daquela energia humana tão concentrada se esvai numa mágica desmaterializante. Borboletas esvoejam de dentro de uma caixa que não se quereria abrir: a caixa das histórias que não acontecerão mais naquela companhia.

E muitas dores e alegrias são necessárias para que se volte a ser leve.

quarta-feira, 31 de março de 2010

Lista de preferências de Orge

(Manual de devoção de Bertold Brecht - Bertold Brecht)

*********

Alegrias, as desmedidas.
Dores, as não curtidas.

Casos, os inconcebíveis.
Conselhos, os inexequíveis.

Meninas, as veras.
Mulheres, insinceras.

Orgasmos, os múltiplos.
Ódios, os mútuos.

Domicílios, os temporários.
Adeuses, os bem sumários.

Artes, as não rentáveis.
Professores, os enterráveis.

Prazeres, os transparentes.
Projetos, os contigentes.

Inimigos, os delicados.
Amigos, os estouvados.

Cores, o rubro.
Meses, Outubro.

Elementos, os fogos.
Divindades, o Logos.

Vidas, espontâneas.
Mortes, instantâneas.

segunda-feira, 29 de março de 2010

domingo, 28 de março de 2010

Domingo à noite

Pego-me pensando
com carinho e crueza
dois completos animais
com certezas e espinhos,
semanas e planos,
belo nó de caminhos
nossas fendas espaciais...
o presente mais estranho,
além de greco-troiano,
seja o amor Laocoonte
e as serpentes, ansiedade.
Qual é mesmo tua idade?